A nova realidade do design brasileiro

O acirramento da concorrência no mercado cosmético e  a consequente sofisticação do consumidor, tem feito com que as indústrias brasileiras de cosméticos enxerguem o verdadeiro valor de um design criativo de embalagem  


Formas diferenciadas, materiais inovadores, tecnologias novas, acessórios que cativam cada vez mais consumidores. É só caminhar por um shopping center ou dar uma olhadinha em um catálogo de venda direta, para perceber que o design de embalagens dos produtos cosméticos não só mudou de uns tempos para cá, como também evoluiu.

Daniela Khauaja, coordenadora Acadêmica da Área de Marketing da faculdade ESPM, credita essa evolução do design brasileiro a duas situações que estão intimamente ligadas: a primeira foi o acirramento da concorrência no mercado nacional, impulsionado, principalmente, pela chegada de marcas internacionais que vêm para cá querendo aproveitar os bons ventos que sopram no mercado cosmético, setor fortemente beneficiado pelo aumento do poder de compra dos brasileiros. A segunda motivação destacada pela professora, reside no fato de que esses importados acabaram elevando o grau de exigência do consumidor brasileiro, que com mais opções e dinheiro no bolso, não aceita levar qualquer produto para casa.

Dessa forma, as empresas de capital nacional e, até mesmo as multinacionais que já possuem operações bem estruturadas no Brasil ficam assim, no olho do furacão, e se veem obrigadas a aumentar os investimentos não somente no desenvolvimento de produto ou na ampliação do portfólio, mas também no design de embalagens. “A brasileira, tendo mais acesso a esses produtos que são importados, que possuem um design diferenciado de embalagem, acaba ficando mais exigente. E para conseguir suprir essa demanda por sofisticação, a empresa é obrigada a investir”, explica Daniela. Ela ainda destaca que a preocupação das empresas não se limita à forma, ou seja, não se restringe somente aos elementos estéticos do design, mas também tenta melhorar a funcionalidade das embalagens. “Hoje se busca um design no sentido estético, mas também as empresas buscam e investem em um design mais funcional e até mais sustentável”, finaliza.

Já Guido Dezordi, dono da agência Lumen Design, argumenta que o aumento dos investimentos em design de embalagem na indústria de beleza tem sido diretamente proporcional à expansão da própria indústria cosmética brasileira. “O que temos notado é uma mudança no patamar de investimento, as empresas têm investido em embalagens de qualidade superior”, revela ele.

Margot Doi Takeda, Sócia-Fundadora e diretora de Criação da A10 Design, não só reconhece o aumento do investimento no design de embalagem por parte da indústria cosmética, como também percebe a valorização do design da embalagem por parte dos executivos do setor, que enxergam o design criativo como uma peça fundamental para um produto se tornar sucesso de vendas. “As empresas perceberam que se elas possuem um design criativo, elas irão vender muito mais”, afirma Margot.

Ela prossegue dizendo que os investimentos atualmente, ao contrário do que era comum há alguns anos atrás, não se limitam ao design secundário, ou seja, aos elementos que dizem respeito à embalagem em si, mas também, têm sido expressivos no design primário, ou seja, no produto em si. “Antigamente os elementos de embalagem mais relacionados ao produto vinham de fora, hoje é feito aqui, desenvolvido por designers daqui”, comemora a diretora de Criação da A10.

Quem investe em forma e quem investe em função
Apesar da evolução do design de embalagem no mercado brasileiro de cosméticos ser visível, a opinião dos três profissionais consultados por Packing Cosmética é unânime: o dinheiro que financiou todo esse desenvolvimento não foi direcionado de maneira igual para todas as categorias do segmento de beleza.

“Nos produtos vendidos em supermercados, assim como os de higiene pessoal como shampoo, sabonete, creme hidratante, entre outros, não é observada uma grande evolução em termos de design de embalagem”, opina a professora da ESPM. Sendo que ela acredita que os produtos vendidos em canais como o porta a porta, franquias e perfumarias, por se tratarem de produtos de maior valor agregado, acabaram recebendo investimentos mais robustos em design de embalagem.

Uma das categorias que mais tem recebido aporte financeiro para inovar no design de embalagem é perfumaria, como consequência direta do próprio tamanho do mercado brasileiro de fragrâncias, que já é o maior do mundo e cresceu mais de 14% em cinco anos. “Eu percebo que a área de perfumaria é a que mais tem investido”, expressa Margot, da A10.

A diretora ainda comenta que as grandes inovações de design nesse segmento têm se dado, principalmente, em duas vertentes: na forma, sendo que a indústria hoje aposta em frascos com formatos diferenciados e embalagens mais sofisticadas, e no “story telling”, tendo em vista que as empresas se utilizam do design das embalagens para contar a história do produto ao consumidor. “O story telling, que começou mais como uma ferramenta para as peças de comunicação, hoje também tem de estar no design das embalagens”, destaca ela.

Já nas categorias de produtos para uso diário, os investimentos têm se destinado a melhorar a funcionalidade da embalagem, com o claro intuito de conquistar o consumidor pela praticidade. “Em perfumaria, em que o consumidor identifica o produto pelo design agregado, os investimentos têm sido mais estéticos, já os produtos de uso contínuo têm investido forte em melhorar o funcionamento das embalagens”, corrobora Guido, da Lumen Design.

Dependendo da indústria para crescer
Apesar do próprio desenvolvimento do mercado brasileiro de higiene pessoal e beleza ter feito crescer os investimentos em produto de maneira geral- inclui-se aí o aumento do aporte para a criação de uma embalagem- o design brasileiro deve seguir em uma trajetória ascendente de inovação nos próximos anos, impulsionado pelo personagem que exerce o papel de protagonistas nas relações de consumo, o consumidor.

A mudança dos parâmetros de qualidade da população brasileira deve forçar as indústrias que querem continuar a ocupar uma posição de liderança nesse mercado, a dar cada vez mais suporte para que as agências de design brasileiras usem e abusem da criatividade para criar novas embalagens. De acordo com os profissionais ouvidos pela reportagem, o auge desse movimento deve se dar no momento em que o design brasileiro de embalagem começar a ser exportado, ou seja, quando as indústrias estrangeiras passarem a contratar os serviços de agências brasileiras para o seu desenvolvimento de produto, consagrando assim, o trabalho dos profissionais daqui. “O que talvez ainda falte para o mercado de design de cosmético brasileiro seja, talvez, começar a produzir design para fora. Porém, isso é algo que também deve acontecer na medida em que as marcas brasileiras também passarem a ocupar um espaço maior no mercado internacional”, destaca Guido.

Porém, não somente as marcas brasileiras devem ocupar um espaço maior nas prateleiras dos consumidores gringos, para ajudar o design brasileiro a ser consagrado fora do País. Aqui dentro, para auxiliar as agências de design a alcançar seu grau máximo de excelência e desenvolvimento, a indústria brasileira deve comprar e aprovar as inovações trazidas pelos designers. Na prática, isso significa também cobrar das indústrias fornecedoras de embalagem um investimento maior na importação de maquinário e na melhora da infra-estrutura, para que o abismo que separa o projeto da realidade seja vencido. “Não é que nós não temos
as ideias, as boas ideias nós temos, o problema é operacionalizá-las”, decreta Daniela.

A opinião de Margot Takeda vai ao encontro da afirmação da professora da ESPM. Para a profissional da A10 os custos de exportação de maquinário e de infra-estrutura são exorbitantes no País, o que leva as empresas fornecedora de embalagem a pensarem duas vezes antes de investirem em uma tecnologia inovadora para o desenvolvimento de embalagens. Quem mais sofre com isso são as empresas pequenas, que não possuem nem escala para convencer o fornecedor a investir, muito menos verba para contratar os serviços de uma empresa fora do Brasil, e acabam tendo que se contentar com os modelos de frascos, potes, bisnagas e cartuchos disponíveis em linha.

Esse raciocínio, inevitavelmente, deságua no assunto que está na boca de todos os economistas brasileiros atualmente: não adianta apostar todas as fichas para o crescimento do País na expansão do consumo, se as dificuldades de investimento na produção emperram a arrancada do Brasil. Os profissionais de design sentem na pele as dificuldades impostas pelo custo Brasil, pois sem o suporte da indústria de embalagem, que tem seus lucros sufocados pelos elevados custos de produção, todas as ideias brilhantes para embalagens inovadoras, acabam nunca saindo do papel, ou jazem enterradas por tempo indeterminado nos computadores das agências, à espera de uma indústria grande que se proponha a bancar a inovação. 

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