Fusões e aquisições no varejo farmacêutico: as cartas do jogo

O varejo farma brasileiro já entrou no radar de grandes grupos de investidores. Como a entrada desses novos players pode impactar o setor? A Mais Sucesso e analistas avaliam e tentam responder a esta pergunta de um milhão de dólares

 
Nos últimos dez anos, o varejo farmacêutico brasileiro tem vivido sua época de esplendor. Esta década ficará marcada na história do setor pelos crescimentos consecutivos anuais na casa dos dois dígitos, assim como pela expansão de diversas bandeiras para além de seus estados de origem e, principalmente, pela formação de grandes grupos varejistas, seja pela aquisição de uma rede menor por outra maior, ou pela associação entre nomes importantes do setor.

Outro movimento marcante que os executivos do segmento assistiram nos últimos anos foi a chegada de grandes grupos de investidores, interessados em abocanhar parte desse grande e suculento bolo que é o varejo farmacêutico brasileiro. E este movimento tem uma explicação: além dos resultados alcançados nos últimos anos, os executivos e analistas não vêm esse crescimento como uma marola, tendo em vista que a expectativa de vida do brasileiro só tende a aumentar, e o consumidor tem dado preferência a canais mais práticos, onde possa contar com um bom atendimento para a compra de itens de beleza e higiene pessoal. Fora isso, esse mercado também é completamente pulverizado, tendo em vista que somente 30% dele está nas mãos das cinco maiores redes.

Somente no ano passado, entraram nesse mercado, por meio de aquisições, a CVS/Caremark – uma das principais redes do varejo farmacêutico norte-americano – por meio da compra de 80% da paulista Onofre; a distribuidora de medicamentos, itens hospitalares e vacinas, Profarma, que adquiriu as bandeiras fluminenses Drogasmil e Farmalife, do grupo mexicano Casa Saba, e um mês depois anunciou a compra de 50% da Drogaria Tamoio, que atua no interior do mesmo estado; e para encerrar o ano, o Grupo Ultra, que congrega as empresas Oxiteno, Postos Ipiranga, Ultracargo e Ultragaz, anunciou a compra da rede paraense Extrafarma, braço varejista da distribuidora Imifarma, que atua nos estados do Pará, Amapá, Piauí, Maranhão e Ceará.

Muda ou não muda?
Que o varejo farma vive um momento dinâmico e de intensa movimentação, é sabido e já foi amplamente discutido. Entretanto, a pergunta que fica no ar é como esse enorme volume de fusões e aquisições de bandeiras irá impactar não somente o setor, mas também o próprio modelo de negócio.
Reynaldo Saad, sócio e analista da consultoria Deloitte, acredita que a entrada de players que nunca atuaram no varejo farma brasileiro, como é o caso das empresas citadas acima, assim como da própria BrPharma, que faz parte do Grupo BTG Pactual, não causará grandes impactos no modelo de negócio das farmácias, tendo em vista que o modelo de farmácia no Brasil já está bem consolidado e representado por marcas antigas e tradicionais.
Já Jorge Inafuco, executivo responsável pelo segmento de varejo na consultoria PwC, acredita que essas novas movimentações e a entrada de gente que nunca jogou o jogo do varejo farma pode ocasionar mudanças, sim. Para o consultor, o futuro do farma brasileiro está no caminho já trilhado em outros países como Estados Unidos e alguns países da Europa: o do varejo de conveniência.

É esse movimento citado por Inafuco que explica a aposta bilionária do Grupo Ultra na Extrafarma. O grupo pretende utilizar a rede de postos Ipiranga e as revendas da Ultragaz, que juntas somam quase 10.000 pontos de venda, para expandir a rede de drogarias. Entretanto, apesar de contar com esse grande número de pontos de venda, a expansão da farmácia paraense se dará de maneira gradativa, começando pelas regiões Norte e Nordeste.

Porém, a conveniência não fica restrita ao compartilhamento do espaço do ponto de venda da farmácia com outros negócios, como no caso de um posto de gasolina. O analista da PwC acredita que o varejo farma brasileiro deve procurar diversificar cada vez mais seu mix de produtos, o que deve impulsionar os grandes grupos a pressionar o governo a flexibilizar a legislação que rege o setor.

Com a entrada e a injeção de capital desses grandes players nesse mercado a concorrência também se acirrará, o que beneficiará os consumidores em especial. Ainda hoje, depois de toda essa movimentação de aquisições e fusões, o varejo farma do País é fortemente caracterizado pelo regionalismo e pela falta de um grupo de fortes players que atuem de maneira ampla em todo território nacional. Segundo Inafuco, com a entrada de grandes grupos no mercado, o processo de abertura de lojas deve ser acelerado e, em breve, os líderes devem chegar a todo território nacional.

Um maremoto de desafios, em um mar de oportunidades
Apesar desse mar de oportunidades que o varejo farma brasileiro ainda apresenta para investidores, são muitos os desafios que eles vão enfrentar para lidar com esse tipo de negócio.

Primeiramente, como já citado anteriormente, as operações das redes de farmácias brasileiras são muito concentradas localmente, e as marcas regionais muito fortes. Sem esquecer que o Brasil é um país de proporções continentais, que conta com uma área de mais de oito milhões de metro quadrados e uma precária infraestrutura logística.

O varejo farmacêutico brasileiro também tem a heterogeneidade como uma forte característica. O layout, o tamanho e até mesmo o mix de produtos variam muito de região para região. Montar uma bandeira que cubra todo o mercado nacional de maneira intensa e homogênea também será um desafio titânico para os que querem estar na lista dos top 5 deste mercado.

Fora isso, as fusões e aquisições passam por um processo de adaptação que culminará na construção de uma cultura para a empresa; porém, o sócio da Deloitte destaca que as companhias devem ser eficientes e rápidas nessa construção de valores, tendo em vista que o mercado se movimenta rapidamente e esse tempo “perdido” no processo de adaptação pode levar a um atraso no procedimento de consolidação da sua bandeira no mercado.

Para finalizar o ciclo de dificuldades, os novos players que estão surgindo no mercado terão de aprender a lidar com as dificuldades burocráticas típicas do mercado de farmácia e de saúde, como a relação com os fornecedores, a ainda enfraquecida capilaridade de mercado, sem contar a rígida e complicada legislação que regulamenta o segmento que, em determinados pontos, muda de acordo com o estado.

Próximos passos
Mesmo sabendo dos desafios, os investidores apostam que o varejo farma ainda é um mercado cheio de oportunidades de crescimento; e está claro que alguns grupos querem ter suas operações montadas de maneira coesa para competir como gente grande quando a nova onda do mercado começar e os líderes nacionais passarem a despontar.

Quando essa disputa realmente se iniciar – depois de retirada toda a bagunça que os processos de aquisição e fusão fazem dentro das empresas – cada ganho de sinergia será necessário, cada cliente novo será importante, cada loja aberta em uma nova região ou novo bairro será crucial para as bandeiras líderes, que lutarão loja a loja pela liderança do mercado.

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